General José Batista de Queiroz
Membro da AHIMTB/DF
Na história das guerras, a atuação da mulher não tem recebido o merecido destaque, apesar de seu papel fundamental nas atividades de retaguarda, no apoio aos combatentes, na assistência aos feridos. Só mereceram destaque oficial aquelas que realizaram feitos extraordinários, como Maria Quitéria (Batalha de Pirajá), Anita Garibaldi (Revolução Farroupilha), Ana Néri (Guerra da Tríplice Aliança), Joana d'Arc (Guerra dos Cem Anos), Florence Nightingale (Guerra da Crimeia) e outras. As mulheres participaram das guerras não apenas nas atividades de retaguarda, mas também na linha de frente, como é o caso de Joana D'Arc e Maria Quitéria. No final da 2ª Guerra Mundial, Hitler empregou mulheres como motoristas, a fim de liberar soldados para o combate. Na Guerra da Tríplice Aliança, muitas mulheres acompanharam maridos, filhos ou pais, dando-lhes suporte de retaguarda, como cozinheiras ou lavadeiras. Outras, conhecidas como vivandeiras, acompanharam espontaneamente seus companheiros. Em ambos os casos, muitas ajudavam na evacuação e no tratamento de feridos. Elas formavam um verdadeiro "exército invisível", desempenhando importante papel no esforço de guerra e no apoio logístico. Deram forte exemplo de patriotismo, coragem e abnegação, servindo de estímulo para o alistamento voluntário de homens. Nunca foram tratadas como heroínas, mas como coadjuvantes de heróis. Isto porque, no campo de batalha, sempre predominou o sexo masculino, tendo o trabalho das mulheres sido relegado a um segundo plano, embora tenham participado ativamente de todo o esforço de guerra. Mas o destaque sempre é dado para quem luta na linha de frente e não para quem trabalha ou luta na retaguarda.
Na Guerra da Tríplice Aliança (1864-1870), Ana Justina Ferreira Néri mereceu destaque como enfermeira, sendo considerada a pioneira do serviço de enfermagem no Brasil. Nasceu na Vila de Cachoeira-BA em 13-12-1814 e faleceu no Rio de Janeiro em 20-05-1888. Casou-se aos 23 anos com um capitão-de-fragata e ficou viúva aos 29 anos. Teve três filhos, dois dos quais escolheram a profissão de médico e o último seguiu a carreira militar. Todos, porém, foram convocados para a Guerra. Em 1865, D. Pedro II criou o serviço de Voluntários da Pátria, visando despertar o sentimento patriótico na defesa do País. Não querendo ficar longe dos filhos, Ana Néri escreveu uma carta ao presidente da Província da Bahia, em 08 -08-1865, oferecendo, como voluntária, seus serviços de enfermagem nos Hospitais de Campanha. Além de conhecimento sobre o uso de plantas medicinais, ela também tinha noções de enfermagem, adquiridas com as Irmãs Vicentinas de Salvador. O presidente da Província aceitou seu pedido e a contratou como enfermeira. Em 1865, incorporou-se ao 10º Batalhão de Voluntários e embarcou para Porto Alegre. Após aprimorar seus conhecimentos de enfermagem com as Irmãs Vicentinas daquela cidade, seguiu para o teatro de operações, iniciando suas atividades de enfermagem no Hospital de Corrientes, na Argentina. Nesse Hospital, havia milhares de feridos, vivendo em péssimas condições de higiene. A primeira providência de Ana Néri foi arejar e limpar as enfermarias, organizando grupos de trabalho, para melhorar as suas condições de higiene e de bem-estar dos enfermos. Esses grupos cuidavam da limpeza, do banho, da higienização do cabelo (para evitar piolhos), das roupas, do arejamento do ambiente. Um jovem paraguaio estava com a perna esmagada, correndo risco de gangrena. Nenhum médico quis operá-lo. Ana Néri amputou-lhe a perna e salvou a sua vida. Quase foi levada à corte marcial pelo diretor do Hospital. Este impôs-lhe, como castigo, a lavagem da roupa suja dos doentes. Ela cuidava dos feridos com amor e carinho, como se fossem seus filhos. Não importava a nacionalidade, se o ferido era amigo ou inimigo. Ela dizia: "Vim aqui para salvar vidas e não para matar homens". Depois de Corrientes, prestou serviços nos Hospitais de Humaitá e Assunção, assistindo os feridos, independentemente de sua nacionalidade. Em Assunção, montou, com os seus próprios recursos, uma enfermaria modelo.
Ana Néri deixou para as gerações futuras um legado de dedicação, abnegação, perseverança e amor ao próximo. Foi uma mulher que engrandeceu a História e mereceu destaque na historiografia oficial. Recebeu, por parte do Instituto Histórico e Geográfico, a denominação de "Mãe dos Brasileiros". A primeira Escola Oficial de Enfermagem no Brasil, criada em 1923, recebeu o seu nome, em 1926. É considerada a Matriarca da Enfermagem e a precursora da Cruz Vermelha Brasileira. Ela é a primeira mulher a ter seu nome inscrito no Livro dos Heróis da Pátria, guardado em Brasília. Em reconhecimento ao trabalho dos enfermeiros, Getúlio Vargas assinou, em 1938, o Dec nº 2.956, instituindo a data de 12 de maio como dia do Enfermeiro. Essa data é também o dia mundial do Enfermeiro, em homenagem à data de nascimento de Florence Nightingale, a enfermeira heroína da Guerra da Crimeia (1853-1854).