13 de jan. de 2010

O Brasil e a Democracia

José B. Queiroz
Construir uma democracia é como educar um povo. Não se faz de uma hora para outra, da noite para o dia. É um processo lento, gradativo, penoso. Exige anos de trabalho, persistência, constância. É uma caminhada que percorre séculos, por estradas tortuosas e difícieis. Muitos pedregulhos surgem no caminho. Nessa caminhada, há riscos de interrupções e até mesmo hospitalização. Tudo pode acontecer. Quanto menor a sua saúde, maior a vulnerabilidade. A sua saúde está relacionada com a tradição, a educação, a economia, as instituições, a justiça e muitas outras coisas. A fragilidade desses ingredientes pode emperrar e paralisar a construção do edifício democrático. Quando eles desfrutam de um certo grau de solidez, a democracia é oxigenada com mais rapidez, celeridade e consistência.  A realidade brasileira dificulta o crescimento e o florescimento da democracia. Ela já nasceu com defeitos e vícios. Surgiu sob o signo da corrupção. A educação se assemelha a uma carroça travada e sem cavalo para tracionar. A economia sempre esteve mais voltada para o Estado do que para o povo. Mesmo quando crescia a níveis elevados, a população continuava pobre. A concentração de renda vem da infância e se agravou com os anos. É um mal crônico e difícil de ser curado. As resistências a mudanmças são fortes e poderosas.

            Apesar das interrupções democráticas que tivemos ao longo da história, ocorridas por injunções políticas e ideológicas, o Brasil sempre se caracterizou como um Estado Democrático, o que não quer dizer Democracia. Liberdade e eleições livres são instrumentos que ornamentam a democracia, mas não são suficientes para defini-la. Tais instrumentos podem sofrer processos de relatividade que deturpam a sua essência.   A corrupção endêmica, a lentidão da Justiça, a má distribuição de renda e a existência de uma significativa massa de pobreza colocam o Brasil distante de seu sonho. Só mesmo um salto de qualidade na eficiência de todos os serviços prestados pelo Estado pode acelerar o encontro da sociedade com a sua aspiração democrática. Os dirigentes brasileiros sempre orientaram suas ações para o Estado e para os seus interesses. A elite política remou, durante toda a nossa travessia histórica, a favor de seus interesses pessoais, deixando à deriva os interesses da população.

Somente no final do século XX, o Brasil começou a entender que precisa melhorar a sua democracia. A Constituição de 1988 foi a linha de partida dessa mudança. Ela ampliou os direitos do cidadão e fortaleceu o exercício da cidadania. A estrutura do Estado, porém, tem sido o maior entrave do nosso crescimento democrático. Representa um verdadeiro contrapeso. Ela tem demonstrado ser incapaz de dar uma resposta ágil e eficiente aos problemas que mais afligem a sociedade. A sua reforma pode dar mais vigor à democracia. Essa reforma deve incidir na representação política, nas instituições, nos impostos, no gerenciamento do Estado, no judiciário. A falta de continuidade dos projetos compromete a eficiência e a eficácia dos investimentos. Os projetos, de um modo geral, atendem aos interesses do grupo político que exerce o poder. Assim, o movimento da democracia brasileira é mais pendular do que linear, oscilando entre os interesses ideológicos da direita e da esquerda. No momento, ela está sob a batuta da esquerda. O problema é que a gente não sabe o tipo de democracia que essa esquerda quer construir. Sua afinidade com governos ditatoriais nos deixa incrédulos quanto à sua vocação democrática. Esperemos que ela não nos legue uma democracia deformada e tendenciosa, oxigenada mais pelo malabarismo totalitário do que pelos ares da liberdade.